"Deitada na grama, o céu empoeirado de Estrelas. Passei o dedo e - curioso -algumas vieram grudadas na ponta. Olhei para cima e assoprei. Foi tanta estrela caindo, que agora eu mal consigo enxergar de tanta Esperança."

(Rita Apoena)

"Há uma pequena chance na minha janela, que eu chamo dia, para extravasar o meu amor, cultivar um amigo, conhecer a história de uma senhora ou me aproximar de um vizinho, abraçar alguém que eu gosto muito, ligar para um velho amigo, viver, viver e viver? Ah… como eu posso reclamar da vida? Eu estou viva! E foi por um triz. Quando alguém olha para você e estende aquele dedo do meio, ele está querendo dizer: “Escuta aqui, você não é mindinho, não é o fura-bolo e, muito menos, o cata-piolho! Você é o maior de todos, amigão!!! Você é o maior de todos!!!"

(Rita Apoena)


"Arrumo o meu cabelo e ele ajeita a camiseta. Existe alguma coisa entre nós: uma vontade mútua de não sermos cinzas. Van Gogh nos borrou de verde-água e agora nos reconhecemos, apesar da multidão. Eu, a moça que sai do trabalho e ele, o moço que entrega panfletos do dentista. É claro que eu sou muito mais do que uma moça que sai do trabalho e ele é muito mais do que um moço que entrega panfletos na rua. Mas tudo o que sei sobre ele é que uma obturação custa menos de dez reais e tudo o que ele sabe de mim é que meu sorriso é amplo e gratuito. Assim, a nossa relação gira em torno de dentes: fortes e insuperáveis. A multidão me atropela, assim como atropela e pisoteia os seus panfletos, mas eu paro por nove segundos, como se apanhasse a última edição do jornal, leio as suas manchetes odontológicas, sorrio ao meu amigo e digo... muito obrigada! A multidão o atropela, assim como atropela e pisoteia meus amuletos, mas ele pára por nove segundos, como se me entregasse os mais belos poemas camuflados, sorri e me diz... boa noite! E eu vou embora, com o nosso segredo guardado no bolso. Ali está meu cavaleiro andante e sua armadura de plástico, colorida, com os preços estampados."

(Rita Apoena)


"Ah menina...

Não precisa ficar com medo. Quando a sua mãe não abrir a porta e você passar o dia todo para o lado de fora, eu vou brincar com você e te abraçar tão forte que este sentimento de abandono irá se transformar em mil e quinhentas borboletas no ar, rodopiando em seu cabelo, fazendo cócegas em sua barriguinha. Então, você irá entender que sua mãe não pode abrir a porta porque dentro do quarto onde ela chora, faz tanto frio e tanto medo que o jeito mais bonito que ela encontrou de te amar foi te deixar para o lado de fora..."

(Rita Apoena)

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